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Opinião: está na hora da Apple repensar as linhas do iPhone

Este artigo foi publicado há mais de 4 anos. Algumas informações podem estar desatualizadas e sem validade para os dias atuais.

Por muitos anos, a Apple manteve sempre uma lógica clara para o lançamento dos iPhones com um novo modelo todo ano, sendo uma grande atualização a cada dois anos e um modelo focado em melhorias internas entre este período. Porém, em 2013, a empresa fez algo diferente ao lançar dois novos iPhones — o 5c e 5s — e desde então segue fazendo algumas mudanças, como a adição da linha Plus e o novo iPhone SE. Para quebrar ainda mais o padrão, a próxima geração do iPhone lançada neste ano pode não ser chamada de iPhone 7. Diante de todas essas mudanças e rumores, faço o meu questionamento: não está na hora da Apple repensar as linhas do iPhone?

Linha de iPhones

Antes de qualquer coisa, é importante relembrar como funcionava a estratégia da Apple para o lançamento dos iPhones. Um ano após lançar o primeiro iPhone, em 2007, Steve Jobs voltou ao palco para anunciar a segunda geração do smartphone com um visual totalmente novo — o iPhone 3G. Apesar de muitos usuários acreditarem que este é a terceira geração do iPhone, o nome “3G” foi utilizado por ser o primeiro iPhone com conexão de internet 3G da operadora.

Mesmo com o novo visual e a tecnologia mais rápida de dados, o iPhone 3G era exatamente o mesmo iPhone original por dentro. Um ano depois, em 2009, a Apple anunciou que estaria lançando uma nova versão do iPhone 3G completamente renovada por dentro, incluindo uma nova câmera de 3 Megapixels capaz de gravar vídeos e um processador muito mais rápido. Por conta das semelhanças externas, o modelo de 2009 foi batizado de “iPhone 3GS” por ser considerado uma versão aprimorada do iPhone 3G — com o “S” de speed (velocidade, em inglês).

A partir de então, a Apple estabeleceu um padrão: haveria um modelo que traria grandes mudanças estéticas e outro com foco em aprimorar os componentes internos no ano seguinte. Assim que um iPhone novo era lançado, o modelo do ano passado continuava sendo vendido por $100 a menos. Foi assim com o iPhone 3G e 3GS, depois com o iPhone 4, 4s e 5. Algumas coisas mudaram, porém, com os novos iPhones em outubro de 2013.

Ao invés de anunciar apenas o iPhone 5s e reduzir o preço do iPhone 5, a Apple optou por descontinuar o iPhone 5 e substituí-lo por um novo modelo similar, o iPhone 5c, que contava com o mesmo processador e câmera traseira, porém em um corpo de plástico com visual diferente dos outros iPhones e com algumas pequenas melhorias. Nunca, até então, a empresa havia anunciado em um único ano dois novos iPhones.

O iPhone 5c não pode ser considerado um fracasso, porém ficou claro que a Apple não obteve o resultado esperado com o aparelho — já que muitos procuravam lojas alternativas que ainda vendiam o iPhone 5 por ter o mesmo corpo de alumínio do 5s. Apesar disso, a partir de então começaram a surgir dúvidas sobre o futuro das linhas do iPhone: iria a Apple lançar dois novos iPhones todo ano? Sempre haveria uma linha “C” para se juntar ao “S”?

A resposta veio no ano seguinte, em 2014, com o iPhone 6 e seu irmão maior iPhone 6 Plus. Desta vez, porém, os dois novos iPhones compartilhavam a mesma geração, com apenas algumas diferenças. No ano passado, com o anúncio do iPhone 6s e iPhone 6s Plus, o padrão de lançamentos do iPhone parecia estar claro novamente: ainda haveria um modelo com mudanças no visual e a linha S posteriormente, agora porém em dois tamanhos — e o modelo Plus com alguns recursos extras. Com isso, a Apple retirou o iPhone 5c do mercado e manteve o iPhone 5s como modelo de entrada junto aos antigos iPhone 6 e iPhone 6 Plus.

O que provavelmente ninguém esperava era uma confusão em forma de rumor no início deste ano, sugerindo que a Apple iria lançar uma versão menor e mais barata do iPhone 6 que iria substituir o iPhone 5s. O rumor passou por diferentes caminhos até se tornar real com o anúncio do iPhone SE: um iPhone 6s que substituiu o iPhone 5s em preço e tamanho, porém sem alguns recursos como 3D Touch e câmera frontal de 5 Megapixels. Agora, a linha do iPhone é composta pelo iPhone SE, iPhone 6, iPhone 6 Plus, iPhone 6s e iPhone 6s Plus.

Como explicar para alguém leigo, por exemplo, que um iPhone SE parecido com o 5s por fora é mais potente do que um iPhone 6 com tela maior e que ainda é vendido por preços mais altos? Ou até mesmo explicar as vantagens de se ter um iPhone 6s ao invés de um iPhone SE? Uma das publicações mais lidas do iHelp BR neste ano foi justamente um comparativo explicando as principais diferenças entre todos estes modelos de iPhone.

Os modelos do iPhone nunca foram tão complicados quanto hoje, porém a situação ainda pode piorar. Quem costuma acompanhar as notícias do mundo Apple provavelmente já sabe que a próxima geração do iPhone que será anunciada neste ano não deve trazer mudanças significativas em nenhum aspecto, algo que deve implicar diretamente no nome dos novos modelos. De acordo com um novo rumor, a Apple não chamará de “iPhone 7” os novos iPhones deste ano, considerando que uma nomenclatura de significado tão forte dentro da lógica que a própria empresa tem utilizado até então não deve condizer com as novidades do modelo de 2016.

Qual será o nome adotado pela Apple nos iPhones deste ano então? Como eu mesmo comentei em um outro artigo no iHelp BR, é difícil saber, porém não me espantaria em ver os novos “iPhone 6SE” e “iPhone 6SE Plus” em setembro representando mais uma das diversas variações que a sexta geração do iPhone teve. Pare por um momento e se imagine tentando explicar as diferenças entre um iPhone SE, iPhone 6s e iPhone 6SE. Ou até mesmo comprando um iPhone 14S. Soa ridículo, não? É por isso que está na hora da Apple repensar as linhas do iPhone.

Como já foi mencionado anteriormente, a Apple não teria conseguido produzir a tempo as tecnologias necessárias para lançar em breve um iPhone com o visual totalmente novo e por isso deve guardar as grandes novidades e o nome “iPhone 7” para o próximo ano. Apesar disso, a tendência é que grandes mudanças no visual de todos os dispositivos se tornem cada vez mais incomum. Chegamos em um ponto que os dispositivos já são extremamente finos, leves e potentes dentro das capacidades atuais, sem que haja muita coisa que chame a atenção para adicionar todos os anos como aconteceu até algum tempo.

Houve uma época em que os computadores mudavam consideravelmente a cada nova geração, incluindo os Macs da Apple, porém isso mudou depois de 2008 quando a empresa se estabilizou com o visual Unibody (de corpo único em alumínio). Os Macs chegaram em um nível que não há mais o que ser feito de tão notável a cada ano, tanto é que o MacBook Pro tem quase mesmo visual desde 2009 — tendo ficado apenas mais fino em 2012 com os novos modelos de tela Retina. Eventualmente, surgem novidades que chamam a atenção, como o MacBook Air e o novo MacBook de 2015, ainda sim dentro do mesmo padrão Unibody. O iPhone e o iPad estão seguindo este caminho e não há problema algum nisso.

Apesar disso, ainda há um grande diferencial entre os Macs e os iPhones que precisa ser resolvido, e é a forma como eles são vendidos. Existem várias linhas de Mac, porém cada uma delas tem seu objetivo bem claro ao consumidor e sequer contam com indicativos para cada geração. O MacBook Air é um modelo de entrada para usuários que não precisam de muito, enquanto o MacBook Pro é focado ao uso profissional de tarefas mais pesadas — e é apenas isso que o usuário precisa saber. Você não encontra no site da Apple dizendo que este é o “MacBook Pro 4, 5, 6 ou 6s”. É apenas o MacBook Pro, identificado como “novo” logo que uma nova geração é lançada. As mudanças a cada ano costumam ser tão discretas que o usuário só tem que saber que um MacBook Pro de 2015 é melhor que o MacBook Pro de 2014 em alguma coisa, assim como provavelmente o modelo Pro de 2015 será melhor que o Air de 2015.

Se a Apple quer continuar lançando várias linhas de iPhone, poderia se espelhar mais nos Macs no futuro. Ao invés de vender vários modelos diferentes na loja, seria interessante que a empresa estabelecesse apenas três linhas: iPhone SE, iPhone e iPhone Plus. Sem número e sem “S”. O iPhone SE provavelmente já está consolidado como o modelo de entrada que veio para ficar, então essa linha poderia ser atualizada eventualmente com os componentes mais recentes — talvez a cada dois anos. O “apenas iPhone” seria um modelo “intermediário” do smartphone, enquanto o iPhone Plus seguiria como o grandão top-de-linha contando com algumas exclusividades — ambos atualizados anualmente. Quando um novo visual ou grande novidade surgisse, certamente chamaria a atenção. No mais, os usuários já estariam esperando apenas por mudanças discretas a cada ano e cientes do propósito de cada linha.

Neste momento, alguns podem se perguntar “mas por que não lançar um ‘iPhone mini’ todo ano ao invés do SE?”, e a resposta é simples: lucro. A Apple hoje comercializa seu principal iPhone por $649 e o modelo Plus por $749, ou seja, por menos que isso o cliente só consegue comprar um modelo antigo ou o SE — que é uma versão “capada” atual. Supondo que a Apple crie um modelo “mini” para lançar anualmente por $549, isso provavelmente faria com que um número considerável de clientes deixasse de comprar o modelo de 4.7 polegadas para economizar 100 dólares, já que ambos seriam iguais em recursos — sem contar que a Apple diminuiria muito sua margem de lucro utilizando apenas peças atuais num produto muito mais barato. Com o SE, a Apple ainda garante que haverá demanda para seus modelos top-de-linha e economiza reaproveitando componentes de modelos anteriores, como a tela sem 3D Touch do iPhone 5s e a câmera frontal do iPhone 6.

E quais as chances disso acontecer? Provavelmente mínimas, já que a questão envolve principalmente o marketing do iPhone que trata cada nova geração como um modelo incrivelmente novo e que você não vai mais viver sem, um must-have — e não é por menos, já que o iPhone é o produto mais vendido da Apple e responsável por mais da metade do lucro da empresa. Penso, porém, que esse método não é mais tão funcional quanto antes, justamente pela questão dos aparelhos terem evoluído até um ponto em que não há muito mais o que fazer além de amadurecer alguns detalhes, o que tem feito inclusive que os aparelhos atuais durem cada vez mais. Um iPhone 3G dois anos depois de ser lançado já estava completamente ultrapassado e lento, enquanto um iPhone 6 ou até mesmo um 5s hoje ainda podem ser considerados ótimos aparelhos para o dia-a-dia.

Por fim, deixo um trecho do livro “Jony Ive — O gênio por trás dos grandes produtos da Apple” de Leander Kahney, que cita uma conversa de Steve Jobs logo após seu retorno para a Apple em 1997. Na época, a Apple havia criado inúmeras de linhas de computadores Macintosh em uma tentativa falha de atrair todos os tipos de consumidores.

Para Jobs, isso não fazia sentido.

“O que encontrei ali, quando cheguei, foi um zilhão de produtos”, diria Jobs. “Era assustador. E comecei a perguntar às pessoas por que eu recomendaria a um cliente um 3400 em vez de um 4400. Quando alguém deve ter um 6500 e não um 7300? E depois de três semanas eu ainda não conseguia entender a diferença entre eles. Se eu não conseguia entender… Como nossos compradores conseguiriam?” A linha de produtos era tão complicada que a Apple tinha que imprimir elaboraras planilhas para explicar aos clientes quais eram as diferenças entre os produtos, tabelas que até mesmo os funcionários acabavam usando como guia.

O que nos resta agora é apenas a esperança de que a Apple não se perca como antigamente em meio aos vários “Air”, “Mini”, “Plus”, “Pro”, “S”, “SE” e qualquer outra coisa que apareça pela frente.

Sobre o autor

Filipe Espósito é jornalista especializado em tecnologia. Criou o iHelp BR em 2009 para compartilhar dicas sobre dispositivos Apple e hoje também utiliza o espaço para cobrir notícias de tecnologia em geral. Atualmente também é editor do site especializado 9to5Mac.