DestaquesNotícias

Spotify descumpre regra da App Store e reclama com a Apple, que respondeu a acusação

Este artigo foi publicado há mais de 4 anos. Algumas informações podem estar desatualizadas e sem validade para os dias atuais.

Que a guerra entre os serviços de música por assinatura já havia sido declarada provavelmente não é mais novidade. Porém agora, de acordo com informações obtidas pelo site Recode, o Spotify decidiu apelar após ter uma atualização recusada na App Store, enviando uma carta para o Congresso dos Estados Unidos em que acusa a Apple de ser uma competidora desleal e favorecer o Apple Music na sua plataforma. A Apple, é claro, não aceitou as acusações e rebateu o concorrente.

Spotify

Histórico do conflito.

Não é de hoje que o Spotify entra em conflito com a Apple por conta do Apple Music. Logo após a Apple anunciar seu serviço de músicas por assinatura, em junho do ano passado, o Spotify começou a enviar emails para seus assinantes pedindo para que eles cancelassem a assinatura por meio do aplicativo para iOS e contratassem o serviço diretamente pelo site. O motivo, basicamente, seria por conta da política de assinaturas dentro de aplicativos da App Store, que não permite a venda de qualquer serviço dentro de aplicativos sem utilizar o sistema interno da Apple — conhecido como In-App-Purchases — e que obriga o desenvolvedor a pagar para a Apple 30% do valor recebido de cada compra realizada no aplicativo.

Spotify 1

Email enviado pelo Spotify no ano passado para assinantes do iOS. “Economize $3 no Premium. Todo mês”.

Para não perder dinheiro, o Spotify sempre cobrou mais caro dos usuários que assinam o serviço por meio do aplicativo para iOS — $12,99 ao invés dos $9,99 cobrados no site. Dessa forma, eles conseguem até hoje pagar a taxa de 30% da Apple e continuar recebendo os 9,99 dólares de cada assinatura, prática que usaram durante anos sem reclamar ou pensar em seus clientes. Logo quando o Apple Music foi disponibilizado, porém, o Spotify começou a questionar a Apple por desfavorecer seus concorrentes, já que o Apple Music é vendido por $9,99 nos Estados Unidos e não precisa pagar nenhuma taxa, enquanto os outros devem escolher entre perder dinheiro ou cobrar mais caro para cobrir a taxa de 30%.

Além de emails, o Spotify também publicou em seu site oficial uma página que instrui os clientes a cancelarem a assinatura feita pelo aplicativo do iOS, já que eles são “obrigados a cobrarem uma taxa adicional” e que isso resulta no valor mais caro da assinatura para estes usuários. Na época, muito se comentou sobre a possibilidade da Apple remover o Spotify da App Store por conta do ocorrido, mas a empresa ignorou — até porque ainda havia a possibilidade de assinar o serviço por meio do aplicativo dentro das regras da loja. O caso parecia ter sido esquecido, ao menos até agora.

Spotify reclama de atualização rejeitada.

Como mencionado no início deste artigo, tudo estava indo bem novamente até o Spotify enviar uma carta ao Congresso dos Estados Unidos. De acordo com a carta, o Spotify fez uma reclamação contra a Apple, afirmando que a empresa se aproveita de práticas ilegais nas regras da App Store para favorecer o Apple Music, obrigando os concorrentes a pagarem taxas que a própria Apple não precisa. Sem entrar em detalhes, o Spotify ainda acusou a Apple de ter rejeitado recentemente uma nova atualização de seu aplicativo para iOS apenas para prejudicá-los. O concorrente afirmou ainda que, mesmo com as novas políticas da Apple de reduzir a taxa de 30% para 15% após um ano, a competição ainda é desleal.

O caso repercutiu e gerou polêmica — o que provavelmente era a intenção do Spotify — porém começaram a surgir alguns questionamentos. A Apple é realmente bem rígida com suas regras da App Store, mas a empresa nunca removeu ou proibiu um aplicativo da loja sem que eles infringissem alguma regra, mesmo de seus principais concorrentes — tanto é que a suíte de aplicativos Office da Microsoft está na loja sem problemas e são até destacados pela Apple eventualmente.

Apple responde Spotify em carta aberta.

Diante do ocorrido, a Apple decidiu se manifestar e também enviou uma carta ao conselho do Spotify, obtida pelo site BuzzFeed. A empresa afirma que a atitude do Spotify é preocupante, já que o concorrente está pedindo tratamento diferencial na App Store e que sua carta tem criado boatos negativos sobre o Apple Music.

“Não há dúvidas que o Spotify já tenha se beneficiado muito com seu aplicativo na App Store da Apple. Desde quando foi lançado na loja, em 2009, a plataforma da Apple já garantiu mais de 160 milhões de downloads para seu aplicativo, resultando em centenas de milhões de dólares em receita para o Spotify. Nós achamos preocupante [o Spotify] pedir por exceções de regras que todos os desenvolvedores seguem e estamos recorrendo publicamente por conta dos rumores e boatos sobre o nosso serviço.”

A Apple discorda da afirmação feita pelo Spotify sobre a concorrência desleal, mais uma vez ressaltando que todos os desenvolvedores seguem a mesma regra de vendas e assinaturas dentro de aplicativos no iOS, mencionando também que desleal é a atitude do concorrente de pedir um tratamento diferenciado para a Apple.

“As regras ajudam os concorrentes, não prejudicam. O fato de nós competirmos [com o Apple Music] nunca influenciou na maneira como a Apple trata o Spotify ou qualquer outro concorrente de sucesso como o Google Play Music, Tidal, Amazon Music, Pandora ou vários outros aplicativos da App Store que distribuem música digital.”

“Nossas regras são iguais para todos os desenvolvedores, independente se eles vendem jogos, livros eletrônicos, filmes ou músicas sob demanda; independente de serem ou não competidores da Apple. Nós não alteramos nenhuma regra quando lançamos o nosso serviço de músicas por assinatura ou quando o Spotify se tornou nosso concorrente. Ironicamente, agora é o Spotify que quer as coisas diferentes pedindo tratamento diferenciado para a Apple.”

Além de apenas responder as críticas do Spotify, a Apple abriu o jogo em relação ao motivo que fez com que a nova atualização do Spotify fosse rejeitada da App Store. O motivo, como muitos já imaginavam, é que a atualização simplesmente quebrou várias regras da Apple sobre compras e assinaturas dentro do aplicativo.

Logo quando o Spotify enviou sua atualização no dia 26 de maio, nossa equipe encontrou vários problemas, incluindo o fato da assinatura dentro do aplicativo utilizando a plataforma da Apple ter sido removida e substituída por um formulário de inscrição que claramente quebra as regras de compras e assinaturas dentro de aplicativos. Essa mudança só foi criada com o propósito de evitar o pagamento das taxas da Apple por seu aplicativo na App Store, enviando um email para quem se cadastrar no formulário concluir a assinatura no site do Spotify. Uma clara violação em nossos termos que todos os outros desenvolvedores seguem.

Antes de encerrar a carta, a Apple dá uma “cutucada” no Spotify e afirma que até mesmo a versão atual do aplicativo disponível na App Store quebra algumas regras, que foram relevadas durante o processo de revisão.

Até onde sabemos, o aplicativo do Spotify que está disponível atualmente na App Store  já viola algumas de nossas regras. Estaremos felizes em facilitar a revisão e aprovação da atualização de seu aplicativo o mais breve possível, desde que vocês enviem uma atualização que esteja de acordo com as regras da App Store.

Tratamento diferenciado ou medo?

Não é preciso procurar muito para perceber que o Spotify realmente está procurando um tratamento diferenciado dentro da loja de aplicativos da Apple. Todos os desenvolvedores que vendem algum tipo de conteúdo dentro de seus aplicativos seguem as regras impostas pela Apple há anos, incluindo os concorrentes do ramo — como o Google Music, Tidal e até mesmo o Netflix. A Apple nunca impediu que desenvolvedores vendam conteúdos por fora de seus aplicativos, desde que haja uma alternativa dentro do aplicativo utilizando a plataforma da Apple. Nem mesmo quando o Spotify começou a notificar os clientes para cancelarem a assinatura no aplicativo do iOS a Apple tomou alguma atitude contra o serviço, já que eles ainda forneciam a assinatura por meio de In-App-Purchases.

Este modelo de compras internas dentro de aplicativos foi adotado pela Apple ainda em 2009, com o anúncio do iPhone OS 3.0 (na época ainda não se chamava iOS). Com as compras internas utilizando um sistema próprio da Apple, os desenvolvedores poderiam vender conteúdos para os usuários de forma rápida e segura, já que os dados de compra do usuário não seriam compartilhados nem passariam por sites externos. Qualquer desenvolvedor pode utilizar o sistema de compras internas da Apple, desde que repasse 30% do valor de cada venda realizada para a empresa. Como mencionado anteriormente, isso não impede que o desenvolvedor também venda o mesmo conteúdo fora do aplicativo enquanto houver a opção de In-App-Purchase.

Para atrair ainda mais desenvolvedores a utilizarem modelos de assinatura em seus aplicativos, a Apple anunciou recentemente que, após um ano, a taxa de 30% por assinatura dentro dos aplicativos cairia para 15%. A taxa menor foi bem recebida por muitos desenvolvedores porém, independente disso, há anos que os grandes provedores de conteúdo disponibilizam assinaturas dentro de aplicativos para iOS e pagam a taxa da Apple sem mesmo aumentar o preço para o consumidor final. O Netflix, por exemplo, cobra o mesmo valor de seus pacotes no site e no aplicativo.

Mas, afinal, por que o Spotify só foi se manifestar agora? Há anos eles cobram 3 dólares a mais dos usuários do iOS sem nunca terem se manifestado sobre o assunto, então por que a mudança repentina de atitude? A resposta é bem simples: o Spotify está se sentindo ameaçado pelo Apple Music. Provavelmente, o Spotify continuaria quieto tirando alguns dólares a mais de quem assina o serviço pelo iOS se a Apple não tivesse apresentado o Apple Music no ano passado.

Apesar de alguns terem duvidado, o óbvio aconteceu: o Apple Music já pode ser considerado um caso de sucesso. Exatamente um ano após ter sido lançado para o público, o serviço de músicas da Apple já conta com 15 milhões de assinantes regulares — sem contar quem ainda está no período gratuito de 3 meses — que colocam o Apple Music em segundo lugar na categoria. O Spotify, que existe desde 2008, conta com 30 milhões de assinantes do Premium. 15 milhões em um ano contra 30 milhões em 8 anos, faça as contas e descubra qual serviço está fazendo mais sucesso.

No ritmo em que tudo segue, é bem provável que o Apple Music ultrapasse o Spotify em assinantes do Premium até o ano que vem. O serviço da Apple ganha cada vez mais força com os álbuns que são lançados com certo período de exclusividade por lá, além de artistas como a Taylor Swift que contam com contrato de exclusividade total. Ainda ontem, surgiu um boato de que a Apple está tentando comprar o concorrente Tidal para expandir ainda mais o Apple Music. Tudo isso deve estar tirando o sono da equipe do Spotify, que já teve até prejuízo em sua receita nos últimos anos.

Não se engane com todo o “discurso diplomático”. As reclamações do Spotify não passam de teimosias por medo de perder seu espaço no mercado de músicas, já que nunca se manifestaram até então, durante anos sem um concorrente à altura — algo que lhes permitia “ditar regras”. Chame do que quiser, menos de preocupação com o cliente que paga mais por isso. A guerra entre os serviços de músicas por assinatura ainda vai longe, mas já está claro quem vai sair ganhando no final.

A carta da Apple para o Spotify pode ser lida na íntegra, em inglês, pelo BuzzFeed.

Sobre o autor

Filipe Espósito é jornalista especializado em tecnologia. Criou o iHelp BR em 2009 para compartilhar dicas sobre dispositivos Apple e hoje também utiliza o espaço para cobrir notícias de tecnologia em geral. Atualmente também é editor do site especializado 9to5Mac.